terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Ad nauseum et infinitum

Os objetos olhavam-no: já não tinha mais o que pensar. A cabeça, farta da ausência de sentidos, pesava-lhe de forma que a segurava com uma das mãos, a mais hábil. Como em transe, piscava menos que o habitual, olhando o nada, o chão, as superfícies; sempre em foco próximo e abaixo à linha do horizonte. Tremia. Sua mandíbula já estava cansada, mas ainda assim insistia em pressionar os dentes contra si próprios. Não suava. Não é de seu costume transpirar, salvo quando encontrava-se em momentos de excitação, quando o pensamento se extrapola e desconjuga-se com a palavra e os gestos, mas não era a esta a ocasião.

Estalava as juntas dos dedos da outra mão, a menos hábil. Ela só sabia fazer isto - estalar os dedos. Por uma questão de simetria, ameaçou fazer o mesmo com a outra mão, a mais hábil, mas a cabeça ainda lhe pendia. Desistiu. Se fosse em outro momento, não teria hesitado. Preferiu retorcer a pele das juntas dos dedos, que lhe davam uma sensação de ardência.

Respirava normalmente. Não havia motivos para ser de outra forma. Porém, ao se expelir o ar, um gosto férreo atravessava-lhe o paladar, fazendo-o movimentar a língua de forma a confirmar se havia algo ali. Não havia. Sequer sua saliva fazia-se presente, tornando sua boca um lugar de textura áspera.

Moveu os olhos. O pouco que procurava ver adquirira cores negativas devido ao olhar estático, mas logo tomavam forma e colorações que sempre tiveram. Não havia graça nisto tudo, nem mesmo quando os objetos que o olhavam perdiam o foco.

O sol, se ponto, azulava o ambiente e ameaçava deixá-lo monocromático se a luz não fosse acesa. E assim foi feito.