terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Ad nauseum et infinitum

Os objetos olhavam-no: já não tinha mais o que pensar. A cabeça, farta da ausência de sentidos, pesava-lhe de forma que a segurava com uma das mãos, a mais hábil. Como em transe, piscava menos que o habitual, olhando o nada, o chão, as superfícies; sempre em foco próximo e abaixo à linha do horizonte. Tremia. Sua mandíbula já estava cansada, mas ainda assim insistia em pressionar os dentes contra si próprios. Não suava. Não é de seu costume transpirar, salvo quando encontrava-se em momentos de excitação, quando o pensamento se extrapola e desconjuga-se com a palavra e os gestos, mas não era a esta a ocasião.

Estalava as juntas dos dedos da outra mão, a menos hábil. Ela só sabia fazer isto - estalar os dedos. Por uma questão de simetria, ameaçou fazer o mesmo com a outra mão, a mais hábil, mas a cabeça ainda lhe pendia. Desistiu. Se fosse em outro momento, não teria hesitado. Preferiu retorcer a pele das juntas dos dedos, que lhe davam uma sensação de ardência.

Respirava normalmente. Não havia motivos para ser de outra forma. Porém, ao se expelir o ar, um gosto férreo atravessava-lhe o paladar, fazendo-o movimentar a língua de forma a confirmar se havia algo ali. Não havia. Sequer sua saliva fazia-se presente, tornando sua boca um lugar de textura áspera.

Moveu os olhos. O pouco que procurava ver adquirira cores negativas devido ao olhar estático, mas logo tomavam forma e colorações que sempre tiveram. Não havia graça nisto tudo, nem mesmo quando os objetos que o olhavam perdiam o foco.

O sol, se ponto, azulava o ambiente e ameaçava deixá-lo monocromático se a luz não fosse acesa. E assim foi feito.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Eu estava errado: o Estadão estava certo (e isto não diz muita coisa)

O assunto de hoje é blog. Você lê blogs? Gosta de navegar por blogs? Provavelmente a resposta é "sim". Afinal de contas, você está em um blog lendo este texto.


Esta nova forma de comunicação descoberta na internet, onde todo mundo pode ser editor chefe de si mesmo, iniciou-se de forma promissora. Quantas vezes não vi algum intelectual ou jornalista dizer que os blogs da vida são uma forma de expressão da vida e que dá a chance de pessoas diferentes, com perspectivas diferentes, relatando opiniões diferentes aos jornalões e à grande mídia de massa. Balela. Em grande maioria, balela. Ao menos no Brasil.


"Tenho um blog. Oi."

Todos se lembram (ao menos quem lê blogs ou assistiu TV em São Paulo) de uma campanha veiculada pelo Estado de São Paulo onde, a fim de promover o seu portal, assegurando este ser um lugar de notícia confiável e factual, denegria a imagem de websites pessoais, mais precisamente, os blogueiros, que supostamente colocariam informações tendenciosas ou imparciais em suas páginas. Confesso até que uma das propagandas da campanha foi plagiada de minha pessoa, mas este meu traço persecutório-paranóico não é tema deste post. Não hoje.

Enfim, muito blá blá blá se deu nos meses consecutivos à campanha. Blogueiros deram o troco, ficaram putinhos, fizeram sátiras das campanhas, diziam "Tomá no cu, não é por aí" e etc. Até tomei partido e fiquei do lado deles, até eu criar o meu blog. Quer saber a verdade (e eu sei dela)? Blogueiros são uns merdas. E o Estadão, também. Eu explico.

Quantas vezes em um blog você viu um texto como este, deste tamanho e criado pelo próprio criador? Nunca, tenho certeza. A questão é que no Brasil a grande maioria dos blogueiros não produzem conhecimento. Mais que isso; sequer são comentaristas de fatos ocorridos no mundo ou em suas próprias casas. Todos eles são um bando de oportunistas que replicam postagens de outros blogs e, em uma ética que só faz sentido para eles, escrevem "Via: Link" ou "Fonte: Link" em letras minúsculas no final do que exibiram. Tudo isto em troca de leitores fiéis que visitam o site frequentemente e clicam em propagandas de patrocinadores ou do google, remunerando os mantenedores. Há ainda aquele que nem a fonte de seus plágios cita, mas este já apanhou demais e está pouco se fodendo.

"Não é cópia, é inspiração."

Para piorar, ainda sobre a ética de faz-de-conta de blogueiros, têm sido muito comum há alguns anos estes sujeitos receberem jabá de empresas e agências de publicidade. Aproveitando que este é um território livre de legislação, as empresas compram o caráter destes sujeitos por qualquer duzentos reais. É simples: basta você falar bem de uma empresa, produto ou postar um videozinho hospedado no YouTube como quem não quer nada, fazendo aquela linha "Haha, olha o que eu achei!". Sorrateiramente formam sua opinião, dizem-lhe o que vestir, usar, comer e comprar como se tivesse sido uma demonstração livre de seus próprios pensamentos. Você gosta e dá risada, afinal, ele tem um blog e é descoladinho, né?

Exemplo de post-jabá. Não é o melhor dos exemplos, mas é o mais recente.

Epa, mas espere! Mas porque os blogueiros fazem tudo isso? Porque eles tem leitores como você. Humor de fácil entendimento, entretenimento, conhecimento vazio e cultura de massa: você gosta de tudo isso. É por isso que você não se importa e talvez nunca tenha se dado conta disto. Para você basta sua dose diária que está tudo bem. Eles ganham dinheiro com seus cliques e você perde com sua internet discada. Talvez seja uma boa troca.

...E o Estadão? Ele - e outros veículos de mídia - faz a mesma coisa que os blogs, porém, mais e pior. Aguarde cenas dos próximos capítulos.

PS.: Generalizar? A exceção confirma a regra.
PS2: Aos blogs que tiveram prints retirados, não é nada pessoal, ok? Somos blogueiros, somos irmãos.